sábado, 31 de janeiro de 2009

Carta a Damien Rice

Querido Damien,

já ouvi muitas vezes que algumas pessoas têm estrelas. Nunca me disseram que alguém podia possuir uma nuvem. Mas você possui. A sua é ainda mais especial, é uma 'bufrei'. Talvez, algum dia, alguém te diga que cloud, em português, é nuvem, não 'bufrei'. Mas isso vai tirar boa parte da magia, porque nuvem, vá lá, até podem ter, mas 'bufrei', só você.

'Bufrei' não conseguiria explicar algo que é inexplicável. Não conseguiria explicar, por exemplo, suas mãos mexendo-se rapidamente à medida em que você falava, como se quisessem explicar algo que apenas sua voz não conseguia traduzir. Nem o sorriso que vinha quando você se enrolava na sua história, um sorriso que, por si só, é inexplicável. Um sorriso tímido? Não. É um sorriso... um sorriso... um sorriso que apenas em minha mente, somado a tudo que foi essa noite, consegue ter algum sentido.

Querido, responda-me uma coisa: você realmente esteve lá? Porque, até agora, é como se eu não tivesse saído de casa, ido até àquela casa de show, ouvido você cantar, contar e encantar, voltado pra casa e criado uma seqüência de palavras como essa, clichê, sem graça e infantil.

Foi você mesmo que me indicou com sua mão o céu estrelado de Dublin? Eu reconhecia sua voz, seu rosto, gravava sua roupa, uma camisa e um calça jeans com aparência surrada, uma coisa simplesmente você, acompanhava seus gestos rápidos, suas palavras, mas não conseguia ter certeza de que aquilo era realidade. Então, querido Damien, responda-me, por favor: você esteve mesmo ali?

Era como se fosse um sonho, entende? É difícil acreditar que, quando a luzes se apagarm totalmente, apenas as velas no palco brilhavam, foi você que cantou Cold Water.

Mas acho, sim, que foi realidade. Nem em meu sonho mais surreal aconteceria tudo que aconteceu. Nem lá você chamaria a platéia ao palco e dividiria-a em grupos, cada qual cantando uma parte de Volcano e formando um curioso coral. Você ali, sentado, no meio de todas aquelas pessoas, regendo-as tal qual um maestro.

Você não é aquilo que imaginei. Damien Rice, para mim, era alguém... eu não sei te dizer quem era Damien Rice. Sua voz vivia em meus pensamentos, em meus dias, em minha vida. Amie, Cannonball, The Blower's Daughter, Elephant, Delicate. Mas você eu não sabia quem era. Não sabia da sua inexplicabilidade, das suas mãos, de seus sorrisos, de seus gestos. De suas palavras.

Damien, você estava ali, com seu violão, cantando de forma sublime cada verso de Cannonball. Você e seu violão. Sem microfones. Sem nada. Foi, lindo, Damien, lindo! Se consigo preferir uma dentre todas as suas músicas que fazem parte de mim, essa canção é Cannonball. E da forma como você interpretou, querido Damien, tocou-me demais. Como você consegue sentir a música desse jeito? É que você não está cantando. Ela faz parte de você, é apenas uma extensão de seus gestos, suas mãos, seus sorrisos.

Faltou Animals, Dogs, Grey Room. Faltou você, a noite inteira. Você poderia ter cantado todas as músicas dos CDs, depois voltando tudo de novo, cantando The Professor, Delicate, Sand, Amie, Woman Like a Man, tudo.

Acho que já estou me tornando repetitiva demais, querido Damien. Só queria tentar me lembrar se alguma vez eu ouvi "Desafinado" em uma versão tão linda. Não, nunca. Ninguém teria aquele... aquele jeito, aquele timbre aquela voz. Os gestos? Também. Ninguém seria você, meu querido.

Por fim, não sei se deveria me desculpar ou qualquer coisa assim, mas não pude deixar de gravar certas partes - como Amie, Delicate, The Blower's Daughter, Cannonball, Desafinado. Acho que você vai entender. Mesmo que tenha cada segundo gravado, cada 'bufrei', eu precisava daquilo.

Foi lindo, Damien. Mas ainda preciso dormir para me convencer que tudo, tudinho, foi verdade, foi real. Que você veio, tocou, cantou, contou suas histórias, riu. Preciso acreditar que aquele homem ali na frente era você, que Damien Rice é exatamente desse jeitinho, simples?, seria clichê. E Damien Rice não é clichê. Damien Rice é, simplesmente, Damien Rice. Inexplicável.

Obrigada, querido Damien.

Com amor,

Amanda

Um comentário:

Marcelo Rosa disse...

Quem é Damien Rice? Uma marca de Arroz? É daqueles semi-prontos?