quarta-feira, 18 de março de 2009

De olhos fechados

Confesso: eu fechei os olhos. Foi um ato totalmente inconsciente e automático, assim como o movimento das mãos, que seguravam com força a alça do cinto.

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A brilhante ideia veio na semana passada. Eu falava que não curtia corrida de caminhão, mas senti uma estranha vontade de fazer um trecho dentro de um monstro desses.
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Fui para Barretos com isso em mente. Pra quem eu poderia pedir esse mega favor? Pro André, claro! Pois estava feito. Eu ia fazer a super prime, no domingo a tarde, com André Azevedo.
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Não foi assim que a coisa funcionou. Quando chegou domingo, André teve algum problema e não pôde correr.
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Pensei bem e decidi pedir carona pro Guido. O pedido podia ter fortes consequências: Salvini era o autor dos saltos mais fodas feitos com caminhão. Deu show nas últimas duas provas em Barretos e entortou o chassi no Sertões depois de quase ter alcançado o pórtico de largada (!!!)
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Ué, e daí?
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Mas também não deu certo.
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Surgiu, então, uma terceira opção. "Por que você não vai com o Felício?" Fui.
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Alguém me jogou um capacete e, enquanto andava para o caminhão, coloquei o negócio na cabeça. Na hora percebi que ele estava sambando um pouco, mas não liguei. apertei o máximo que deu e sentei no banco do meio.
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Enquanto ele ia para a largada do circuito, comentou com o navegador que "falaram pra saltar". Aí o cara olhou pra mim e perguntou: "o cinto está bem apertado, né?"
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Puxei mais a alça e segurei com força. Já estava me sentindo meio arrependida.
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O diretor de prova _meu pai, por coincidência_ deu a largada. Merda! Não dava mais tempo de desistir!
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Minha primeira impressão: não tem como seu cérebro ficar no lugar dentro daquela coisa. Sua cabeça balança pra lá e pra cá e eu sentia vontade de colar o pescoço no banco para ver se tudo parava de mexer.
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O caminhão corria e eu me prendia ao banco, arrumava o capacete e agarrava a alça do cinto.
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Logo no começo tinha um saltinho pequeno _nada comparado ao mega salto no fim do circuito. Pois naquela pequena saliência eu já vi o que me esperava.
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A última vez que eu havia entrado em um veículo de rali fora em Erechim, 2006. Corri na super prime com o Tino Vianna, culpa do Costinha, mas foi uma delícia. Nos saltos eu sentia um frio na barriga e o carro voltava ao chão de maneira suave. O Tino é o cara!
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Eu tinha ainda alguma esperança de que correr de caminhão tivesse alguma semelhança a correr em um Lancer _mesmo que tudo indicasse exatamente o contrário.
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As curvas do Tino não eram brutas. As do caminhão, entretanto, me davam a impressão que íamos capotar a qualquer momento.
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O Felício controlava o monstro com precisão. A gente não ia capotar, eu sabia disso. Mas não tirava isso da minha cabeça, talvez até para não pensar no salto do final.
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Mas não adiantou evitar. Ele chegou. Na hora em que ele subia, eu fechei os olhos e agarrei forte a alça do cinto.
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Voamos. Achei que nunca mais íamos voltar ao chão. A sensação de não ter nada embaixo do caminhão é inexplicável. Liberdade. Leveza.
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Mas tudo isso durou poucos segundos. Porque em seguida eu senti um tranco também inexplicável. Cacete, o que era aquilo! Eu cerrei os olhos com ainda mais força e pensei todos os palavrões que conhecia. Ainda tinha mais uma volta e eu estava com vontade de pedir para parar.
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Em todos os meus _muitos_ anos de automobilismo, nunca tinha passado por nada parecido. Já tinha corrido de Evo, Sherpa e o já citado Lancer, já corri de Porsche em Interlagos e Jacarepaguá, mas nada se comparou à experiência do caminhão. É algo dolorosamente único.
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Enfim, o bicho voltou ao chão e continuou correndo. Eu não pedi para parar, mas minhas preces foram atendidas. "A suspensão estourou!" "Não o pneu tá furado". Paramos.
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Foi assim a minha primeira experiência em um caminhão: dolorida e incompleta. Por isso já estou pensando em quem vai me dar carona na próxima vez. Prometo que não vou fechar os olhos.
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(Créditos: foto do Guido - http://www.michelin.com.br/
foto do incrível salto do Felício - Zé Mário Dias)

Um comentário:

Anônimo disse...

Muito bem Mandy, quem gosta de automobilismo e principalmente quem escreve sobre automobilismo,tem q participar de tudo (até de corrida de carrinhos de rolimã!)para sentir e passar aos leitores como é a realidade dos fatos. Parabéns pela coragem!
Tirando as chacoalhadas deve ter sido show!