Oi, Ale,
é estranho escrever uma carta para você, uma pessoa que eu nem sequer conheci de verdade - quer dizer, uma verdade relativa, porque tudo é relativo. Veja bem, eu te conheci virtualmente, a gente trocou algumas palavras, acompanhava um ao outro nessa incrível rede que é o twitter. Incrível porque, assim como eu me apeguei à sua luta, vi muitas pessoas conhecendo muitas outras, formando laços de verdade, coisa bem bonita.
Eu te escrevo porque precisava de um motivo para falar sobre o nada e o tudo, e decidi que a gente sempre quer contas as coisas para as pessoas queridas. E você é querido, muito mais do que você imagina, acho.
Eu queria te contar sobre saudade, separações, amizades, essa coisa toda. Ontem fez dois meses da sua morte, e foi ela que me fez tomar algumas decisões na minha vida - porque a gente não sabe quanto tempo o tempo tem. Eu tenho esse minuto agora, esse segundo, mas não tenho o segundo seguinte. E é por isso que a gente precisa viver de verdade, para poder aproveitar cada segundo que a gente tem. A gente tem muita mania de deixar o tempo passar, achar que ele vai curar tudo. Mas às vezes ele não cura do jeito que a gente quer, e o que fica? Fica a dor por a gente ter deixado tudo nas mãos dele.
"A única coisa inevitável é a morte". Sei lá se ouvi isso em algum lugar ou se minha cabeça que criou essa frase, mas tenho pensado muito nela. A gente fica com aquela coisa depois da morte. Putz, por que eu não fiz isso com fulano? Por que eu não falei aquilo com beltrano? Por que eu não te conheci, Ale? Mas enquanto a gente ainda tem tempo, a gente pode. Pode tudo. Mas, principalmente, a gente pode não se afastar dos outros.
Eu não entendo muito essa necessidade que a gente tem de vez em quando de se afastar. O que resolve? É uma espécie de morte voluntária. Bam, você matou a pessoa na sua vida. Só que não. A pessoa continua viva, e aí eu tento entender por que a gente quer tanto que ela não esteja ao nosso lado.
Nesses dois meses eu tentei entender isso. E ainda tô tentando, mas não consigo. Mas também consigo.
Dói, sabe? Perder pessoas que continuam vivas acho que dói mais do que as que estão mortas. Quando elas tão mortas, não tem mais jeito. Mas vivas? Fica aquele gosto de fracasso, uma dor diferente, de saber e não saber. Às vezes a gente lida bem com isso, mas eu não sei jogar esse jogo, e sei menos ainda com o passar dos anos.
Parece que tudo era mais fugaz quando eu era criança. Eu conhecia o amiguinho na praia, na praça, na chuva, na fazenda e ele já virava meu melhor amigo do dia. Aí a gente ia embora e acabou.
Mas agora a despedida dos amigos dói mais. Às vezes se mescla com a infância já findada, como o amigo que foi morar na Itália e volta sei lá quando. Doeu ele ir embora. Mas teve também aquela que sumiu sem dizer nada e dava as caras de vez em quando, e agora a gente nem sabe mais quando vai se ver. Sempre fica a pergunta: por que esse sumiço? Por que esse abandono repentino? A gente devia se formar juntas e sei lá mais o quê. Mas não foi isso que aconteceu.
E teve o outro que rolou e não rolou, e aí ficou aquele clima estranho e a gente decidiu deixar o tempo passar. Mas como se faz isso? Esse tempo tem prazo de validade? Ou um dia a gente vai se encontrar nas ruas virtuais e ficar de bate-papo, e, bam, voltou a ter amizade?
Mas o que acontece nesse tempo? O que aconteceu no tempo em que eu e o amigo que foi pra Itália não nos falamos por absolutamente nenhum motivo? E o que vai acontecer nesse tempo em que eu e o outro amigo não trocarmos figurinhas?
É tudo muito indefinido, Ale. Você tava se recuperando, a gente botava fé. Eu tava até pensando em ir te visitar quando tudo se acalmasse, tinha um presente especial e tal. Mas o tempo não deixou. E o tempo não vai deixar uma série de coisas, porque ele acaba. É natural.
E se o tempo não tivesse deixado? E se o tempo não deixar? É isso que passa pela minha cabeça, Ale. É ter medo de ficar com um monte de se. E a gente fica, porque a vida é feita de escolhas e, invariavelmente, a gente vai se perguntar se o outro caminho era mais bacana. Mas tem se que dói mais, tem se que a gente sabe que devia ter sido diferente, devia ter dito mais flores, mais pássaros cantando e blá.
É isso que eu queria escrever pra você, Ale. Esse monte de se que dói na alma e que, na verdade, nunca chegou a tempo. Porque, como se sabe, o se sempre chega atrasado.
Com amor,
Amanda
terça-feira, 7 de fevereiro de 2012
Os espasmos nos olhos
Mais um pitaco da Amanda Roldan às 11:20
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário